quarta-feira, 1 de maio de 2013

Paulina Chiziane é "mais" que os antropólogos

Fiquei muito curioso quando vi aquela foto da nossa escritora moçambicana Paulina Chiziane na revista moçambicana Lua. Tratava-se afinal de contas duma entrevista em que ela apresentava o seu novo livro que seria e foi lançado em 2012. Fiquei muito satisfeito, pois gosto da cultura moçambicana, dos seus fazedores e do seu constante desenvolvimento e expansão a nível nacional e internacional.
Revista Lua número 8 III de 20 de Janeiro de 2012
Durante a leitura da entrevista, deparei-me com uma passagem na qual Paulina diz: ‘‘Os antropólogos fiam no que foi dito por outros. Eu busco algumas verdades nas raízes da minha terra.’’ Tive que me lembrar de alguns conhecimentos sobre a antropologia e os seus métodos de investigação e constatei que um deles é o da observação participante. Este método de investigação consiste na fixação do investigador num lugar durante um tempo suficiente para a observação e recolha dos dados necessários para o estudo que pretende realizar. Realmente, não é possível observar tudo ao mesmo tempo. O que ele não conseguir observar durante aquele período, poderá ele fazê-lo nas próximas investigações se necessário ou um outro cientista poderá fazê-lo. Os dados colhidos são posteriormente sistematizados e analisados cientificamente.
Revista Lua número 8 III de 20 de Janeiro de 2012
Relativamente ao trabalho de Paulina Chiziane, coloco-me as seguintes questões: Que mecanismos ou métodos usa para ‘‘buscar algumas verdades’’ nas raízes da sua terra? Não conversa com ninguém sobre o assunto de que deseja escrever? Não observa a forma de como as pessoas agem e reagem naqueles contextos?
Durante a sua entrevista, apresentada na revista Lua, Chiziane afirma ter conversado com um curandeiro da província de Niassa e que este último tinha curado o seu irmão. Este facto mostra que a escritora ouviu alguma coisa de alguém (ouviu o que os outros dizem ou o que o outro disse). A escritora fiou também no que este curandeiro disse sobre a história de Moçambique (mais informal); Fiou no que o curandeiro disse sobre a função e relação entre ‘‘todas as plantas’’ e os seres humanos. Este facto leva-me a não compreender a diferença entre o que esta escritora faz e fez como método de recolha de informação e o exercício que é feito pelos antropólogos para recolha de dados. A diferença que se nota é que os antropólogos categorizam a informação colhida e analisam-na com vista a produção do conhecimento científico antropológico e Chiziane produz um conhecimento literário (cultural).
Revista Lua número 8 III de 20 de Janeiro de 2012
Pelo que vejo, a nossa grande escritora moçambicana usa provavelmente de forma inconsciente alguns métodos de recolha de dados que são específicos da ciência antropológica. Mas, procura distanciar-se deles, apesar das semelhanças entre o seu trabalho e uma parte do trabalho dos antropólogos investigadores.
Mais questões podem ser levantadas em relação à afirmação de que ‘‘Os curandeiros são os maiores depositários da cultura em Moçambique’’. A que curandeiros se refere, se nos encontramos num contexto em que há vários tipos de curandeiro? De que tipo de cultura está a falar visto que este conceito envolve uma diversidade de elementos característicos humanos (dança, canto, instrumentos musicais, gastronomia, teatro, cinema, literatura oral ou escrita, etc?
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Revista Lua número 8 III de 20 de Janeiro de 2012
A escritora afirma ainda: ‘‘Vou defender com unhas e dentes que existe um saber africano que não está em nenhuma universidade”. A nossa escritora conhece todas as universidades do mundo e a proveniência dos saberes que lá se encontram em qualidade e quantidade?
Não pretendo desacreditar a nossa escritora, apenas buscar esclarecimentos para algumas imprecisões sobre as suas afirmações em relação a realidade moçambicana que apresenta. Reconheço que Chiziane apresenta um raciocínio muito original sobre a nossa realidade e que essas afirmações não foram de modo nenhum irracionais.


 

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